sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Mochilão 2008 - Dia 10

O dia em que um pen drive quase acaba com o Rafting


Esse era o dia de mais um grande objetivo da viagem ser comprido. Havia reservado um passeio para fazer rafting no pé da cordilheira e acordei ancioso naquela manhã. Tomei café e aproveitei o tempo para acessar a internet e enviar algumas fotos. Guardei as garrafas de vinho e arrumei a mochila no armário de forma bem cuidadosa, afinal de contas minha curta jornada em Mendoza estava chegando ao fim, aquele seria o último dia em terras Argentinas e na manhã seguinte estaria seguindo viagem para o Chile. Minha condução chegou, da mesma forma com o motorista e um guia, porém o espírito era outro. O motorista de intitulava “El pirata” pois andava com um lenço na cabeça, e o guia era bem descontraído. O grupo não era composto de jovens em sua maioria. Abaixo dos 30 anos apenas tinha eu e dois garotos de aspecto europeu. Todos os outros eram argentinos, mas a idade não era determinante no entusiasmo. Os portenhos compostos por 2 casais eram animados e de espírito jovem. Ao grupo também existia uma americana, de aspecto latino, que durante todo o percurso até o posto de esportes radicais estava lendo um livro de Jorge Amado, em inglês, cujo título não me recordo (creio ser capitães de areia). Durante a viagem uma lembrança péssima: eu havia esquecido o pen drive com o primeiro lote de fotos da viagem descarregada da maquina no computador
– E se alguém levar o pen drive eu perderia todas as minhas primeiras fotos – Pensei desesperado.
Nossa, como aquilo havia morgado de forma parcial minha ida aos Andes. Pensei o dia todo sobre aquilo mas procurei me tranqüilizar pois nada poderia ser feito até eu voltar e constatar o sumiço ou sua presença. Essa era uma das táticas que eu havia adotado para poder tirar fotos e mais fotos, além de fazer vídeos da viagem. Se por ventura perdesse a maquina, ou deletasse sem querer as fotos dela, teria o primeiro lote a salvo, porém esse primeiro lote agora estava em perigo pois o gerente de risco que mora na minha cabeça não havia mensurado esse risco.
Ao longo do caminho, muitas risadas e entrosamento entre os portenhos e os guias, coisa que acabara de excluir parcialmente os demais, claro que de forma não intencional. O brasileiro em questão, os galegos de aspecto europeu e a americana com cara de latina ficavam apenas observando as conversas sem entender a fundo e rindo de forma simpatica e sociabilista. Por algum motivo eu não conseguia me expressar em espanhol, não sei se o sotaque me fazia entender menos ou algum outro fator, e o que havia sido motivo de maior abordagem social em Buenos Aires acabou se tornando motivo de exclusão em Mendoza. Porém voltei as origens dos primeiros dias da viagem fui me esforçando com a linguagem universal da mímica, tentando me fazer entender.

Chegando na estação ao pé da cordilheira dos andes, o guia havia me dito que o passeio que eu desejava não haviam mais interessados, apenas eu. Havia optado por um rafting mais longo, de 3 horas de duração o qual um dus criterios que o guia se utilizava para me fazer desistir dessa aventura solitaria era de que exigir muito esforço físico, coisa que minha modéstia ignorava. Porém pelo mesmo preço eu poderia fazer o passeio mais curso, de 1 hora com os demais da turma, e um treeking pela montanha. Apos alguns portunhois e mímicas topei a empreitada, afinal de contas flexibilidade faz parte de um roteiro de viagem.
O local era bem agradável e parecia ter saído de algum filme de aventura. O frio era forte na área e fazia algo em torno de 12 graus, sem falar que as águas do rio Mendoza, caudalosas e fruto do degelo das montanhas, estavam a 8 graus. O estúpido aqui foi de bermuda e botas e tremia até o tutano do osso. Aguardamos os preparativos, comi um sanduíche e desisti dos esforços de entender o que tanto os portenhos conversavam. Fui dar uma volta e tirar umas fotos, com a cabeça ainda no pen drive rezando para o santo protedor dos usuários de informática descuidados que protegesse meu pequeno datatraveler de pessoas inescrupulosas que talvez não soubessem o valor sentimental daquele pequeno item.
Todos prontos, devidamente vestidos com as roupas especiais, hora de ir para o ponto de saída. Fomos além do acampamento, creio que uns 8 Km acima, um grupo de motoqueiros estilo americano passa por nós, além das montan has e do rio Mendoza para complementar a paisagem. Paramos em um ponto e avistamos ao longe 3 mamíferos da mesma família dos lhamas, mas me asseguraram que não eram lhamas apesar da forte semelhança. Recebemos as instruções e nos dividimos em dois botes.
- Listos?? Adelante ??
Esse era o comando básico. Seguíamos remando forte para desviar das correntezas, depois parávamos e nos saudávamos com os remos. Uma pequena disputa era criada com o outro bote, para ver quem chegava primeiro, sem falar em que cada ultrapassagem era regada com água gelada do rio Mendoza nos oponentes. A paisagem era deslumbrante, A adrenalina alta o frio intenso, tanto que tive que trocar o remo de cabo de alumínio por um emborrachado, pois meus dedos estavam cadavericamente roxos. O medo de cair dentro do rio também era uma constante, apesar das instruções de segurança dadas, as águas ferozes do rio davam a entender que qualquer instrução de segurança seguida à risca seria inútil. No melhor do rafting o pior aconteceu: Com tanto esforço para as remadas senti um estralo intenso na coluna e uma dor na base dela, fruto da patologia que vinha se arrastando desde o último dia de Buenos Aires. Sentei no fundo do bote e sinalizei que estava com dor. Sensação duplamente horrível, a dor era grande e estava a perder meu rafting que por tanto tempo havia planejado. Esse sentimento de perda iminente e arrependimento posterior profundo me deram forças para ignorar as reclamações constantes do meu organismo e seguir. Sentei novamente na borda do bote e remei bastante, menosprezando as pontadas na coluna. Sempre em frente, ou “adelante”, remamos forte a favor da correnteza, desviando de pedras, redemoinhos e mesmo do outro bote. Por um momento o companheiro de bote logo a minha frente, em um momento muito voraz do rio, caiu nas águas geladas e um desespero instantâneo tomou conta de todos, principalmente dele. Logo apenas sentamos preocupados e buscamos refletir as normas de segurança para resgatá-lo, ele também teve essa consciência abrindo os braços e procurando boiar enquanto remávamos em sua direção – Não olhe para a luz – Gritava o instrutor, fazendo todos rirem e absorver um pouco de tranqüilidade dentro da situação. Resgatamo-lo e comemoramos muito, com o tradicional cumprimento com os remos para o alto. Chegamos exaustos de volta ao posto, felizes e animados, conversando muito sobre os eventos.
Sentamos no bar da base para conversar um pouco, trocar de roupa e sair para o trekking. Boa parte da turma, exclusivamente os portenhos, participou da caminhada. Seguimos após alguns instantes a caminhada morro acima, por dentro de um duto de água e depois por entre vales e leitos de riacho seco, a coluna estava dura de tanta dor que ainda me acometia. Subimos um morro onde do alto se avistava a vastidão da cordilheira, o rio Mendoza, os trilhos do trem, a base de esportes radicais e a estrada que cruzava a cordilheira. O Pirata, sempre animado, falava coisas divertidas, por muitas horas não interpretáveis por mim, mas todos riam muito. No alto do morro uma conversa descontraída, sobre o que não sei, mas me esforçava para entender. Todos tomando mate, inclusive eu experimentei um pouco, me pareceu agradável mas estranho para um primeiro gole. Era uma coisa que se via com freqüência entre os portenhos e mesmo os mendocinos, todos adoravam mate, sempre levavam um pote com a erva, outro com açúcar e uma garrafa termina, que muito se vendia nas ruas de Buenos Aires e que em Recife só havia visto em lojas japonesas a preços triplamente maiores.


A lógica do mate era simples: em terras frias, a bebida quente ajudava a regular a temperatura do corpo, além do gosto agradável para o paladar dos sul-americanos de terras frias. Existe o nosso Chimarrão, do sul do Brasil, que se não for a mesma bebida com um nome diferenciado, é um irmão americano de grande proximidade.
Voltando para a base, o grupo conversava bastante até o momento do retorno. A relação entre a minha pessoa e os portenhos era estranha, pois senti que eles gostavam da minha presença, que parecia gostar das mesmas coisas que eles, mas que por divergências lingüísticas estava com dificuldade de se comunicar, por outro lado também tive a impressão que a queda do companheiro do bote ter sido ocasionada por mim, por uma remada mau sucedida, e que alguns olhares que interpretei como sendo de reprovação me foram direcionados mas no geral gostei da alegria daquele grupo. Eram casais de idade média de 40 anos, mas com espírito jovem, que gostavam de viajar com suas esposas e maridos para fazer atividades diferenciadas da rotina de suas vidas as margens do rio da prata.
Todos devidamente alojados na van, regresso para o hostel. Ainda a coluna doía e a preocupação com o pen drive também. Os casais estavam marcando de fazer um luau na base à noite, comprariam cervejas e combinaram com o Pirata para ir. Não me manifestei. Aqueles dias em Mendoza estavam sendo muito metódicos e estava com medo de perder o horário da viagem para o Chile no dia seguinte. Creio ter perdido uma boa festa, uma boa oportunidade de ter mais contato com aquele pessoal. Mas infelizmente nunca saberei.
Chegando no Hostel, hora de arrumar as malas. Algumas roupas que não secaram foram ensacadas para não molhar as demais e o banho que ainda não tomara iria esperar para o Chile. Haviam algumas pessoas no hostel e sentei com elas para conversar, ainda não tivera contato com elas e pelo visto eram exatamente como eu imaginada: peregrinos que apenas estavam de passagem e não curtia atividades capitalistas como sair para bares e boates. A Mariana e o German desceram e ofereci um dos vinhos para eles como forma de despedida. Tomamos eu e a Mariana, o German nos acompanhou na conversa. Foi meio triste, mas o vinho afogava as mágoas. Me despedi dos amigos Neuquenses e já mentalizando futuras viagem ao sul da argentina no futuro para rever os colegas. A Mariana era dançarina e tinha se interessado pelo Forró, que eu falara e mostrei em alguns vídeos do youtube.
E o pen drive??? Ahhh, ele estava lá no computador quando tinha chegado do Rafting. Felicidade plena e agora teria que dormir para chegar cedo a estação de ônibus e ir para mais uma cidade, ou melhor, para um novo pais: o Chile.

Notas:

Rafting

trekking

Rios Andinos - Empresa de esportes radicais

Um comentário:

Nívia Gouveia disse...

Imagina se você tivesse feito o passeio de 3 horas com a dor na coluna..